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Quem gosta de viajar para destinos de natureza, sempre passa por rios, praias, piscinas naturais onde a diversidade de peixes encanta e faz as paisagens ainda mais bonitas. No Brasil, os peixes ainda fazem parte da cultura gastronômica de muitos destinos.
Se você gosta de conhecer mais para viajar melhor e gosta de viajar melhor para conhecer mais, vai gostar de ver a reportagem publicada recentemente na Revista Fapesp em que pesquisadores investigaram quais os motivos de a América do Sul ter a megadiversidade de peixes que tem.
Confira trechos que separamos
Tem aruanã, bagre, cascudo, candiru e curimba. E ainda dourado, lambari, linguado, matrinxã, peixe-galho, piranha, surubim, tambaqui, tuvira, uaru.
Com uma das mais extensas redes hidrográficas do mundo, a América do Sul abriga uma variedade de peixes de água doce tão grande que é possível enumerar vários deles para cada letra do alfabeto.
São aproximadamente 5.800 espécies conhecidas (pouco mais de um terço das identificadas no mundo) e, estima-se, quase 3 mil por descobrir.
Nos rios, córregos, lagos e lagoas temporárias dessa região do planeta, há peixe com as mais variadas formas, cores e tamanhos.
Do minúsculo Priocharax nanus, um peixinho alongado e quase transparente de 1,5 centímetro de comprimento, ao colossal Arapaima gigas, o pirarucu, de até 3 metros e cauda avermelhada, cujas escamas, da dimensão de um polegar, formam uma couraça contra o ataque de predadores.
Toda essa diversidade, a maior do mundo, desperta há tempos a questão:
Por que há tanto peixe por aqui?
Uma explicação abrangente foi apresentada em um artigo publicado em janeiro na revista PNAS.
Fenômenos geológicos dos últimos 55 milhões de anos teriam causado ao menos cinco reconfigurações de grande porte nas bacias hidrográficas sul-americanas que promoveriam surtos importantes de formação de novas espécies, com um pequeno nível de extinção.
Ocorridas em intervalos de tempo longos, essas transformações na paisagem produziram dois efeitos principais. Em algumas situações, conectaram sistemas de rios e lagos antes separados, provocando em algumas áreas a mistura de espécies distintas, como aconteceu entre 33 milhões e 23 milhões de anos atrás com o surgimento de um vale ligando a bacia do rio da Prata e alguns rios da costa brasileira.
Em outras, criaram barreiras que bloquearam a circulação dos peixes, isolando populações que passaram a evoluir separadamente e originaram novas espécies, como se observou na Amazônia com a formação do arco Purus por volta de 20 milhões de anos atrás, que separou as porções leste e oeste dessa bacia hidrográfica.
“Conseguimos evidências sólidas de que está correta a ideia de que os eventos geológicos influenciariam o surgimento e a extinção de espécies, sugerida por naturalistas como o alemão Alexander von Humboldt [1769-1859] e o britânico Alfred Wallace [1823-1913].”
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As origens da América do Sul
Concluída a separação da África, há cerca de 100 milhões de anos, as terras do imenso bloco rochoso que forma a América do Sul passaram muito tempo sob influência dos oceanos.
Toda vez que o clima se tornava mais quente e o nível do mar subia – em alguns momentos ele esteve 200 metros acima do atual –, suas águas avançavam centenas de quilômetros continente adentro, ocupando as terras baixas e isolando os sistemas preexistentes de rios.
Quando o planeta resfriava, a água do mar retrocedia, tornando a planície costeira mais extensa e possibilitando o surgimento de novas conexões entre os cursos d’água nessas áreas. “Os avanços e recuos dos oceanos devem ter sido importantes para o surgimento de novas espécies, em especial na periferia do continente”, explica o ictiólogo Roberto Reis, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS), coautor da pesquisa.
Ambiente prop´´ício à vida
Esses rearranjos na paisagem proporcionaram uma diversificação de peixes heterogênea no tempo e no espaço. A análise da árvore filogenética permitiu identificar ao menos cinco mudanças abruptas no ritmo de surgimento de novas espécies.
Segundo Reis, da PUC-RS, a América do Sul tem hoje uma megadiversidade de peixes porque, além de a dinâmica geológica ter favorecido o surgimento de uma grande variedade de espécies, os fatores climáticos ocasionaram um baixo nível de extinção. “Aqui não houve formação de grandes desertos como aconteceu em regiões tropicais da África e da Austrália. A região também não foi afetada por glaciações tão intensas quanto as que ocorreram na Europa e na América do Norte”, explica.
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Leia mais sobre o assunto direto na fonte: Artigo de Ricardo Zorzetto, publicado na Edição 325 da Revista Fapesp mar. 2023